sábado, 27 de dezembro de 2014

Eu fugi. 



Da vida amarga 
dos fardos pesados 
demais que eu nunca 
pedi para carregar. 



Eu fugi. 



Das lágrimas engasgadas 
que teimavam em me seguir 
como sombras líquidas 
de um passado 
lembrado e esquecido. 



Eu fugi. 



Da minha máscara destroçada 
da minha alma destruída 
que de sonhos desprovida 
nem teimava em existir.



Eu fugi. 



De toda e qualquer faísca 
de esperança que 
pudesse incendiar o gás 
triste que escapava dos meus ossos 
curtidos em mágoa. 



Tudo isso porque 
de você 
Eu fiquei. 
Sozinha.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Essa é só mais uma carta (aberta) de amor

E aí, tudo bem?

Eu sei que você deve estar achando estranho isso tudo, mas eu só queria dizer que te amo. Calma! Me deixe explicar. Toda a minha vida eu tenho me encantado com pessoas das mais diversas personalidades e só agora eu percebi que nunca deixei nenhuma delas saber disso. Engraçado né? Como escondemos nossos sentimentos mais bonitos do mundo, com medo de criar situações ruins e constrangedoras. Mas enfim! Se você está lendo isso aqui é porque eu gosto demais de você! Da sua pessoa, da sua personalidade, do seu humor, do seu abraço, da paz que você me transmite, das conversas, das risadas... Pode ser que a gente nem se fale direito ou tenha alguma intimidade, mas se você caiu de paraquedas nesse post, tenha certeza que eu quero mudar isso. 

Fico muito frustrada quando não acho uma abertura pra me aproximar daqueles que eu admiro e tenho simpatia, por isso eu fico sempre tentando puxar conversa, tentando ajudar, ser engraçada e solícita. Aproveito e peço desculpas se esse meu jeitinho espalhafatoso de ser te incomoda; Sei que muita gente não gosta muito. Se estivermos separados, não tema! Você ainda tem um lugar especial no meu coração e eu sinto muito a sua falta. Se estivermos juntos, bom, você também tem um lugar aqui dentro. Não tenha medo do "eu te amo"; Ele nem sempre vem atrelado ao compromisso. Não cobro admiração, não cobro atenção, muito menos ser correspondida. O intuito disso aqui é só deixar você sabendo que alguém nesse mundão de meu deus gosta de você do jeito que você é, sem tirar nem pôr, e que é grato por toda e qualquer coisinha boa que você tenha feito.

Obrigada por tornar meus dias mais alegres, por me consolar, por me ouvir, por me acolher, por me orientar, me incentivar, colocar algum juízo nessa cabeça de vento, me fazer rir, pela sua gentileza, por compartilhar dos mesmos gostos e paixões e finalmente, obrigada por ter lido isso até o final! Elogios e sentimentos tão bons assim existem para serem compartilhados e eu escolhi compartilhar com você.

Com muito amor e gratidão,
Lu

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

"É preciso sair da ilha para ver a ilha..."

O despertador tocou em algum lugar no meu sonho. Eu sabia que era hora de levantar e encarar mais um dia. Um banho bem tomado e uma xícara de café forte já davam conta de eliminar os resquícios de uma noite mal dormida, mesmo que por dentro eu continuasse completamente adormecida. Eu entrei no ônibus às 6h45, assim como no dia anterior e no dia anterior àquele. Sentei no mesmo lugar e olhei a mesma paisagem pela quinta vez naquela semana. Aquela rotina que há alguns meses me provocava a sensação emocionante de estar embarcando numa nova aventura simplesmente tinha se dissipado.  Assisti aquelas mesmas aulas, ao lado dos meus não-tão-amigos-assim, troquei algumas palavras com pessoas que me faziam feliz por alguns minutinhos daquele meu dia cheio de vazio, andei de volta pra casa e finalmente sucumbi. Minha cama já tinha o molde perfeito do meu corpo e por mais que meus lençóis fossem coloridos e o quarto permanecesse impecavelmente arrumado, tudo não passada de uma fachada. Senti a dor pulsar nas minhas têmporas durante minutos que se arrastavam e finalmente levantei, apenas para tomar um remédio e mais uma dose de cafeína. Olhei para minha mesa abarrotada de lembretes, papéis e coisas para fazer; Tudo cuidadosamente ignorado ao longo da semana. Ou do mês. Eu nem lembrava mais o que era tudo aquilo acumulado, mas sabia que era a representação física do meu estado emocional. A voz da minha mãe ecoava na minha mente, me mandando arrumar o quarto porque só assim eu arrumaria as coisas dentro de mim. Alguns velhos costumes nunca morrem. 18h45. As horas voam quando apenas as contemplamos passando. Meu celular estava quieto. Ninguém mais se incomodava em me chamar para qualquer coisa nas sextas à noite, afinal, eu quase nunca aparecia. No início era a falta de dinheiro que se transformou em falta de disposição e acabou em falta. Faltavam amigos. Faltavam bons momentos. Faltava um pouco de felicidade na minha vida rotineira. Inesperadamente meu celular vibrou, me surpreendendo com uma oportunidade. Sorri comigo mesma imaginando a força maior que rege o universo interferindo na minha vida mais ou menos, me dando uma chance de viver a vida que eu sempre quis viver quando mais nova. Algo dentro de mim pareceu encaixar-se, mesmo que o frio na barriga indicasse o tanto que eu estava apreensiva em sair da minha própria caverna. Suspirei e abri meu armário. Abandonei meus pijamas de sempre e vesti algo que me fizesse sentir bem comigo mesma. Fiz o possível para ficar apresentável e, enquanto fechava a porta do meu quarto, fiz uma promessa silenciosa de que arrumaria aquela mesa no dia seguinte. 

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Sobre o último dia mais feliz da minha vida

Não último de final. Por favor, ainda tenho muito o que viver, obrigada. Mas "último" no sentido de "mais recente". Tão recente que não aguentei chegar em casa para escrever isso. Vim digitando no celular durante todo o caminho porque meu coração estava (ainda está) tão cheio de alegria que transbordou essas palavras bonitas aqui. Pela primeira vez, e eu sei que falo muito de primeiras coisas aqui, eu percebi o quanto eu já mudei desde que pus os pés em Belo Horizonte. Hoje embarco pra minha terrinha baiana para matar a saudade dos meus amores maiores que ficaram por lá (beijo mãe! beijo mô!), e como se não bastasse esse pequeno grande motivo para que meu dia fosse sensacional, eu ainda tive o prazer de me sentir amada pelos meus amigos. Eu sou muito dependente de pessoas e de contato humano. Gosto de ajudar, me intrometer, puxar orelha, dar carinho, dar colo, dar consolo... Porém isso nunca foi tão forte como acabou se tornando quando me vi numa realidade tão nova. Acho que estar distante das pessoas que eu conheço há tempo me fez investir nisso muito mais. Sempre fui conhecida pelo egoísmo no meu núcleo familiar. Minha mãe sempre fez questão de me lembrar que esse é o meu maior defeito e eu fico muito grata em constatar que eu já não vejo esse traço em mim. Essa semana eu comecei os dias ficando muito mal por inúmeros motivos, mas a reviravolta que minha vida deu em um pequeno espaço de 24h foi assustadora. Conquistei uma das coisas que eu mais queria aqui, a moradia universitária, tornando a minha vida e a dos meus pais muito mais fácil. Isso me deu uma nova perspectiva de futuro que eu nem sequer arriscava a ter e a felicidade é imensa, quase não cabe nos meus 1,59 de dignidade. Mas esse não é o foco desse texto. Eu queria agradecer de coração, do fundo dele, na sua completude, às pessoas que me abraçaram hoje e disseram estar feliz por mim. Por eu estar voltando pra casa, por eu ter conseguido a moradia, me desejando boa viagem ou apenas porque gostam de fazer isso. Eu prezo muito pelo bem estar alheio e pela primeiríssima vez, eu vi como é bom ter gente que cuida da gente assim. Não que eu não tivesse amigos que zelassem por mim, mas falo de relações que foram fruto dos meus cuidados e do meu carinho desde que cheguei em Minas. Fico feliz de finalmente ter averiguado o quanto eu pertenço ao curso que escolhi (valeu galera da Cria!) e mais contente ainda por agora ter me apaixonado pelo que pode ser o foco do meu atual/próximo semestre. Esse texto pode não fazer o mínimo sentido pra quem está lendo aí, mas eu só precisava escrever que cheguei aqui Salvador e hoje uma parte de mim se tornou Belo Horizonte. Obrigado a você que me deu um pouquinho do seu carinho hoje e me fez uma pessoa muito mais feliz!

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Sobre os encontros e desencontros da vida

A maioria das coisas que eu digo aqui são momentâneas. Tem muito do meu humor diário, das minhas situações mensais, dos meu questionamentos existenciais da vez... No início dessa semana eu me peguei discutindo com amigos sobre como eu não acredito em coincidências. Nada é por acaso. Na minha mente, eu não consigo me conformar que o fato de eu ter vindo parar nessa cidade, num curso que eu não tinha nenhuma intenção de fazer, tenha sido apenas uma aleatoriedade do destino. Sei lá... Parece que tudo se encaixou depois desse gigantesco passo. Sempre que consigo parar para pensar com clareza, percebo que dia após dias tenho caminhado para viver a vida que eu sempre quis. Belo Horizonte tem sido minha amiga e companheira, me fazendo encontrar pessoas que me fazem sentir em casa, outras que me dão um choque de realidade, outras que simplesmente me fazem questionar a minha personalidade e os meus atos; Enfim, finalmente sinto que estou chegando em algum lugar, mesmo que eu não faça a mínima ideia do que me aguarda ali na frente. Saramago já dizia: "É preciso sair da ilha para ver a ilha. Não nos vemos se não saímos de nós". Saí completamente da minha zona de conforto, do meu mundo infinito particular e repetitivo, me propus a fazer coisas que nunca havia feito antes, a tentar conhecer gente e fazer amigos (de verdade!), a tratar todos bem (na medida do possível) e, acima de tudo, me permiti ficar perdida e apenas deixar a vida me levar. Foi difícil? Foi, mas me sinto dona de mim mesma depois disso. Do meu querer, do meu saber, do meu futuro e da minha vida, principalmente. Sinto saudade das coisas que já vivi, mas a ansiedade pelo que pode acontecer consegue me deixar distraída por bastante tempo. Em algum momento da minha pré-existência eu devo ter assinado um termo que dizia: "Eu, Luiza de Simone, precisarei mudar para Belo Horizonte para me encontrar e descobrir o que eu quero da minha vida". E foi assim. Ponto final. Aliás, ponto de continuação. O final dessa jornada ainda tá muito longe.

domingo, 7 de setembro de 2014

A vida sempre continua

Hoje eu acordei em prantos. Fazia muito tempo desde que eu tive um pesadelo tão forte como esse. Fiquei encolhida debaixo das cobertas tentando acalmar as batidas do meu coração, tentado sobreviver ao nó que sufocava minha garganta. Respirei fundo uma dúzia de vezes e fiz a única coisa que eu poderia fazer: Levantei da cama para enfrentar mais um dia sozinha. A pilha de pratos na pia pequena era um lembrete das minhas tarefas domésticas que aguardavam pacientemente para serem realizadas. Não sentia fome, o que era uma raridade, mas comi para preencher o vazio dentro de mim. Sentei na pequena sala vazia e pouco iluminada, ouvindo o som do silêncio que ecoava em cada cômodo. 

Imaginei minha mãe na cozinha preparando tudo para o almoço e ela apenas falava coisas vagas que me eram familiares até demais. Imaginei o samba que sempre tocava nos fins de semana lá em casa. Imaginei meus gatos se enroscando no meu colo, pedindo carinho como sempre. Acho que se eu não tivesse a capacidade de criar esses mundos paralelos dentro da mina mente, certamente eu não teria sobrevivido à solidão que me acomete semanalmente. Noite passada minha mãe tinha me falado que a família estava se mobilizando para preparar o que provavelmente seria o último aniversário da minha vó. Senti um aperto no coração ao constatar que eu não estaria presente. Tive medo de não conseguir mais vê-la antes dela partir. 

Na verdade, medo é o que mais me habita nesses últimos tempos. Medo de ficar sozinha e de não me encaixar. Medo de voltar para casa e perceber que tudo mudou. Medo de ser abandonada e esquecida pelas pessoas que amo. Medo de precisar mudar para me adaptar. Suspirei pesadamente e encarei meu reflexo na tela da televisão desligada. As olheiras apenas cresciam, mesmo que eu tivesse dormido mais que oito horas na noite passada. Há muito meu cabelo não via uma tesoura e isso me incomodava profundamente. Sempre que eu me vejo diante de uma situação difícil, faço algo no cabelo. Na noite anterior vi muitos vídeos de pessoas pintando o cabelo de azul e acordei determinada a fazer isso também. Exceto pelo pequeno fato de que não queria arriscar fazer sozinha e eu não tinha quem quisesse me ajudar. 

Ainda eram oito da manhã, surpreendentemente cedo para um domingo frio. E pensar que naquele momento, há alguns anos atrás, eu estaria voltando pra casa depois de mais um desfile em comemoração à Independência do Brasil. Eu estaria almoçando com minha família. Eu estaria feliz. Sempre odiei a teoria de que precisamos perder para dar valor, e odeio mais ainda o fato de que é a mais pura verdade. Nunca dei valor à minha mãe e família como dou hoje. Nunca senti tanta falta de ter alguém pra compartilhar a vida como sinto hoje. Nunca me vi tão sozinha quanto me vejo hoje. Hoje eu só sento e escrevo para tentar esvair todos esses sentimentos ruins que volta e meia me assombram, simplesmente porque não acho que alguém teria paciência de ouvir sobre todos os meus sentimentos absurdamente sombrios e contraditórios. 

Estou aprendendo a viver sozinha e acho que esse vai ser o maior desafio que vou enfrentar na vida. Não precisar de ninguém, ser auto-suficiente, me sentir confortável em partilhar o espaço comigo mesma. Deixar que as pessoas deem uma passada rápida para ver como minha vida anda e fingir que está tudo bem, mesmo que não esteja. Agora são quase meio dia e eu pretendo arrumar a casa e fazer almoço. Comer sozinha, como todos os outros dias do mês que passou. Ver uma série que ainda não vi. Ler sobre a vida dos outros e rir de mim mesma por não estar buscando algo do tipo. Espero, sinceramente, que um dia eu possa ser alguém que eu me orgulhe. Espero de verdade que eu consiga tirar proveito dessa experiência que eu escolhi passar. Meu orgulho não me deixa desistir; Sempre foi assim e sempre será. Mesmo que eu queira voltar para casa, mesmo que eu queira abandonar tudo, não vai acontecer. No fim, tudo fica bem. Se não está bem, é porque ainda está longe de acabar.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Duas partes de um todo

E ela era meio assim, meio assado, meio indecisa, meio arrogante, meio metida à escritora e apreciadora de boa música, meio piadista, meio garota sensível com medo de crescer, meio menina querendo ser mulher. Meio romântica desenfreada, meio intransigente, meio tirada à sabe-tudo, meio gente grande. Ela era meio baixinha, meio gordinha, meio moleca, meio boca suja, meio inteligente, meio nerd. Era meio precipitada demais, egoísta demais, carente demais e meio madura de menos. Ela era meio gata, meio vira-lata com parte pedigree, era meio de rua, meio de casa, meio mimada. Ela era meio manipuladora, meio maliciosa, meio tarada, meio curiosa, meio medrosa. A garota era meio. E tudo o que ela precisava era de alguém para fazê-la inteira. Inteira com começo e fim, não só meio. 

Contos Inacabados Do Amor Infinito

Escrevi esse conto há um ou dois anos. Naquela época ele tinha um sentido, mas hoje só me traz alguns arrependimentos e lembretes de que devo aprender com meus erros. Faz parte de um dos meus muitos projetos de livros que talvez nunca saiam do meu word. Enfim, espero que curtam essa época medieval e amor dramático, é sempre a minha especialidade.

"Cansaço. Era isso que me consumia. Estava cansada de toda essa dança cega e surda de amores suspeitos e flertes duvidosos. Estava cansada dessa esperança sufocada no meu peito que, todas as vezes que via um sorriso seu ou ouvia uma palavra doce, se inflava. Confesso que tudo isso não passava de um masoquismo ilusório; Um jogo perigoso onde à medida que eu me deliciava com minhas expectativas – falsamente alimentadas – sentia dor, ansiedade, inquietação por permanecer no escuro.

- Posso falar com você? – Perguntei ignorando todas as borboletas no meu estômago, me forçando a olhar para frente e não para meus próprios pés.

E é óbvio que você concordou educadamente, mesmo que apreensivo. Observei seu peito subir e descer algumas vezes, ao passo que eu mesma fazia força para lembrar como respirar. Tanto tempo de espera, de observação, de medo... Tudo isso se encontrando no fim de linha. Eu não tinha mais para onde correr.

- Dois meses – Eu disse com a voz vacilante de quem ainda estava insegura – Foi o tempo que passou desde o primeiro dia que te notei até hoje, o dia de hoje. – Respirei fundo buscando coragem e encontrando oxigênio – Você chegou assim, sem quê nem porquê e quando me dei conta, já não conseguia mais vê-lo somente como um amigo. Estava perdidamente apaixonada pela sua risada, seus olhos, seu sorriso, suas manias, sua voz, suas ideias... E mesmo que eu não seja correspondida, que eu seja somente vista como amiga e companheira, eu queria que esse fato fosse de seu conhecimento. – Um leve sorriso brotou em meus lábios ao recordar todas as imagens que vinha guardando trancadas em minha mente – Queria que soubesse o quão bom homem, bom moço e bom amigo você é, e que eu te desejo toda felicidade do mundo em sua busca pelo amor verdadeiro, você merece.

Terminei minha fala com um alívio no peito, similar a um espaço livre numa sala abarrotada de móveis velhos e empoeirados. Não tremi ou chorei; Só repirei pela milésima vez e me pus a andar em direção a lugar nenhum. Senti o choque da sua mão fria em contato com minha pele quente, o que parece incendiar a esperança em meu peito, e virei o rosto olhando e seus olhos pela primeira vez desde o início daquele ato. Eles não pareciam alegres, com aquele castanho brilhante e luminoso; Estavam escuros e apagados, quase sombrios. Finalmente estremeci, temerosa pelo que viria, mas obriguei-me a sustentar aquele olhar doloroso.

- Gosto de você – Ele falou mantendo o tom de voz baixo e rouco – Mas não o bastante para torná-la minha. Aprecio sua afeição e me sinto triste por ter deixado tudo isso ocorrer. – Tomou fôlego, talvez procurando coragem como eu mesma fizera minutos atrás – Eu lamento muito.

Fiquei parada pelo que me pareceu alguns minutos, mergulhada num torpor profundo, e só acordei quando senti os braços frios me envolvendo num aperto consolador. Seria, provavelmente, a última vez que teríamos tal proximidade, logo, procurei captar todas as características físicas daquele que me tinha nos braços. O cheiro cítrico exalava de suas vestes e se misturava agradavelmente com o aroma de hortelã que mantinha seu hálito fresco; A textura do linho da sua camisa e do couro fino de seu colete que criavam um contraste entre si; A temperatura fria do seu corpo, coisa que raramente se alterava; Suas proporções perfeitamente normais; A pele branca de alguém que mal via o sol; Os cabelos lisos, curtos e escuros, que teimavam em não ficar no lugar; o rosto de traços finos e bem esquadrinhados; E por último, porém longe de ser o menos importante, seus olhos: castanhos, profundos e extremamente expressivos. Compilei todos esses detalhes numa gaveta que tranquei e decidi esquecer no fundo da minha mente. Engraçado como agora parece ter sido tudo mais demorado do que realmente foi, mas aconteceu tão rápido que tive que correr para não deixar escapar nada, nenhum rastro da sua presença.

Lembro-me que fiquei inerte diante da situação e que depositei um último beijo em seu rosto antes de me dirigir aos meus aposentos. Gostaria de dizer que depois de um tempo você percebeu o quão compatíveis éramos e que procurou para darmos início à uma nova história...Porém não foi bem isso o que aconteceu. Recordo-me agora de ter me demorado para matar o bicho da esperança dentro de mim e só o fiz depois de muito tempo à observar-te com outras moças e me amaldiçoar por não ter nascido como elas. Não é uma história com um final feliz, teve fim trágico e dramático em minha cabeça, com direito à mergulhos ocasionais em entorpecentes e tudo. Mas na verdade não saiu do comum, acontece com tanta gente, porque seria diferente comigo? Com o passar dos dias você foi esquecendo, encontrando novas pretendentes, tratando-as com a sua cortesia usual, como perfeito cavalheiro que era. Eu me escondi, fingindo que havia superado, que não via nada, e se via, não me importava, o que era mais um  dos meus atos no teatro do masoquismo. No meu eu, minha alma sofria por não ser sua e sentia um estranho prazer ao ser imaginada nos corpos de suas novas amantes. Realmente, foi um final infeliz que nunca tive coragem ou forças para mudar. Entretanto, não me arrependo de ter me confessado, pois, naquele poucos minutos de poucas palavras, senti que você foi inteiramente meu... Por poucos minutos."

sábado, 16 de agosto de 2014

Infinita Highway


 A música me fez abrir os olhos. "Thrift Shop" sempre fora uma das suas favoritas para momentos de animação. Estávamos na estrada, aparentemente viajando, pois o banco de trás do carro estava cheio de coisas. Agarrei um travesseiro pequeno e pus ao redor do pescoço. Olhei para o lado e você estava lá; Com seus óculos escuros, a camiseta de Star Wars que tínhamos comprado juntos, sua bermuda xadrez que eu já tinha decorado até a quantidade de linhas... Te ver daquele jeito me despertou algo engraçado. Um misto de saudade e conforto. Aquilo que sentimos quando chegamos em casa depois de uma longa viagem. Algo me impedia de falar, tocar e até me mover em sua direção. Você falava coisas e fazia comentários que eu não conseguia discernir, mas fiquei satisfeita só em poder te ver rindo e fazendo suas caras engraçadas. O carro estava impecavelmente limpo, você devia tê-lo lavado antes de cairmos na estrada. Não me era familiar estar ali, ao seu lado, enquanto você dirigia. Talvez aquela fosse a primeira vez, talvez a primeira depois de muito tempo. Eu gostava. Eu parecia estar no lugar certo. A paisagem do lado de fora era predominantemente verde e o dia estava ensolarado, daqueles que eram quentes e tinham um céu azul sem nuvens. Quis perguntar para onde estávamos indo, mesmo que não me importasse. Qualquer lugar com você seria bom.

A melodia lenta de "Yesterday" começou a tocar e eu quis estender a mão para o som e mudar a faixa, porém não pude. Aquela música sempre te deixava triste, consequentemente também me deixava. Fechei os olhos novamente para não ver a sua reação diante daquela letra melancólica e o som foi se afastando, sumindo, se esvaindo da minha mente. Abri os olhos novamente e você tinha sumido. Não havia mais estrada, nem carro, nem viagem e muito menos calor. As paredes desbotadas do meu quarto dançavam com o silêncio profundo do aposento frio. Fora a primeira vez que sonhei com você desde a mudança e o sentimento de saudade se instalou no meu corpo por algum tempo. Tantas vezes acordei com você ao meu lado que esqueci o que era acordar sozinha num dia de sábado e não ter nada pra fazer, nem companhia pra sair. Percebi o quanto estava vivendo pela metade. Órfã da melhor parte de mim; Fazendo as mesmas coisas todos os dias, nada que conseguisse preencher esse vazio dentro do peito. Levantei e risquei meu calendário. Cento e nove dias faltando para eu me tornar inteira.